Vejo-me um belo (mesmo) dia a fazer um trabalho pela recolha de cortiça.
Acabado o trabalho conversei com um homem que empilhava placas em fardos.
Contou-me que se tratava de um trabalho que exigia perícia para que as placas ficassem bem arrumadas. E contou mais. Contou que nessa matéria ele podia ser tão bom que, noutro belo dia, tinha até sido abordado por um potencial comprador no sentido de que a cortiça fosse bem compactada, "bem compactadinha". E que até lhe tinha inicialmente pago um almoço.
Contou também que o comprador tinha voltado daí a uns dias para se certificar que a coisa estava a ser feita a preceito e que, além do almoço da praxe, "até" lhe tinha deixado ficar uns cobres.
O operário mostrou-se contente por ter podido demonstrar as suas habilidades em matéria de enfardamento. E mais, demonstrou ter feito valer a perícia "obrigando" o comprador a uma despesa significativa. Dúvida não ficava que a despesa era justificada pela competência.
- Mas porque carga de água queria ele a cortiça tão excepcionalmente bem compactada? - Perguntei eu.
- Porque além de poupar no transporte leva mais cortiça. A cortiça é vendida ao metro cúbico.
Evidentemente que não se trata de um história de corrupção. Tratava-se apenas de fazer valer o valor do operário prejudicando quem lhe paga em favor de quem paga a quem lhe paga.
Numa primeira análise parece que além do Chico esperto se ficou também a rir o Chico estúpido. Mas não tive coragem para tentar averiguar ao certo qual o Chico de onde tinha partido a iniciativa.
Pelo mundo do politicamente correcto, a chico-esperteza é sempre do capitalista, do patrão, do empresário. O empresário comprador foi o algoz que abusou da ética do operário, coisa justificada por se tratar de uma medida contra um outro empresário, necessariamente igualmente algoz.
...
Aparecem regularmente alminhas que reclamam pela falta de ética, pelo analfabetismo, pelo clientelismo e mais uns quantos cancros que por aí circulam. O que dificilmente deixam escapar é um gemido por falta de moral e, nesta circunstância, o queixume vem, quase de certeza, pelas bandas da esquerda.
Quem mais que a esquerda, globalmente do BE ao PS, mais ataca o comportamento não necessariamente do foro da lei, mas que assenta em valores éticos e morais? Será preciso lembrar as futuristas medidas de destruição da família? Do casamento por quotas? Da liberalização do aborto? Da substituição do papel da família pelo papel da escola e do estado? Da delapidação da autoridade dos pais, dos professores, dos mais velhos, dos agentes de autoridade pelo "activismo" de tudo quanto ataca o respeito por aquilo que tem mais sustentação ética argumentando que as excepções justificam o derrube, da economia baseada no valor real das coisas em troca pela fé pela qual todo o investimento estatal resulta na criação de empregos?
Que dizer da lata com que se aponta a "falta de capacidade" da iniciativa privada em encontrar negócios lucrativos substituindo-a pelo investimento estatal, esse sim, capaz de perceber onde florescerá a árvore das patacas como se não se tratasse de um assalto ao bolso do contribuinte?
E aquela peregrina ideia de redistribuir riqueza antes de a produzir?
E aquela recorrente ladainha pela qual tudo quanto é ideia estúpida está automaticamente abençoado porque “vai utilizar energias renováveis”?
Irrita-se a esquerda contra a existência de paraísos fiscais mas nem uma lagrimazita face ao inferno fiscal que ela zelosamente faz crescer empoleirando simultaneamente nele os seus aranhiços.
Que dizer da "escola" que defende o papel do estado e dos "competentes" organismos na definição dos correctos progenitores para rebentos cujos pais insistam numa educação à revelia das "aspirações da humanidade"?
E, finalmente, que dizer da imbecil tentativa de substituição das pessoas por Magalhães (amen)?
E depois há o rebéu-béu das carpideiras esquerdoides, e mais não se quê, e que o substrato é fraco e que a ética anda pelas ruas da amargura, e blá blá blá ...
... hhmmmm.