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quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Comunicação social portuguesa: o reino dos idiotas

Via Blasfémias, escreve Nicolau Santos:
Artur Baptista da Silva é um ilustre desconhecido para a maioria dos portugueses. Mas não devia ser um ilustre desconhecido para o Governo. Em primeiro lugar, porque coordena a equipa de sete economistas que o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, decidiu criar para estudar o risco geopolítico e social na Europa do Sul como resultado dos programas de ajustamento. E em segundo, porque é ele que ficará encarregado do Observatório Económico e Social das Nações Unidas para a Europa do Sul, a instalar em Portugal a partir de 2013.

Quais são as razões que levam a ONU a estar preocupada com o ajustamento nos países do Sul? Por um lado, a Europa, que tem sido uma grande zona de paz social, está agora a ser confrontada com uma mancha de descontrolo no Sul que pode gerar a passagem, "por osmose, dos problemas do Sul para o Norte". E a tal mancha de descontrolo assenta no aparecimento, em países catalogados como ricos, de bolsas de pobreza, que atingem milhões de pessoas. Segundo as contas do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUP), em Portugal existem dois milhões de pessoas que vivem com menos de 7 euros por dia, o limiar da indigência. E no limiar da pobreza, menos de 14 euros por dia, estão três milhões de pessoas.

Por outro, os sete economistas passaram, todos eles, por países onde processos de ajustamento semelhantes foram levados a cabo, "com resultados tenebrosos", na opinião do Artur Baptista da Silva.

Tendo por pano de fundo estas razões, a ONU propõe então a renegociação da dívida acumulada pelos países sob intervenção externa e que os está a asfixiar. Nesse sentido, os sete economistas analisaram os fundos estruturais a que estes países tiveram acesso, mas que obrigavam a um co-financiamento nacional, e chegaram à conclusão que 41% do total da dívida soberana portuguesa, que de 1986 a 2011 soma €121 mil milhões, resultam precisamente dessa obrigatoriedade e não de decisões políticas internas ou de políticas económicas erradas. Defendem assim que o Banco Central Europeu refinancie esta parte da dívida a vencer à taxa de 0,25% por um prazo de dez anos, bem como a suspensão do artigo 123 dos estatutos do BCE por uma década para que a instituição possa comprar dívida soberana no mercado primário. Portugal pouparia assim €3,1 mil milhões com esta operação.

A segunda proposta é que a troika aceite um desconto global de 15% sobre o total dos juros a pagar, na casa dos €34.4 mil milhões, pelo empréstimo que nos foi concedido de €78 mil milhões. Este montante de juros é superior a 40% do total do empréstimo, o que "é um absurdo para um fundo que se diz de assistência."

Finalmente, a parte do FMI no empréstimo a Portugal usa os Direitos de Saque Especiais (DSE), que estão indexados à cotação de quatro moedas. A penalização cambial de Portugal entre 2012 e 2015 é estimada em 12%, devido à valorização do euro em relação àquelas moedas (dólar, euro, iene e libra esterlina), num total de mais de €2 mil milhões. A ONU propõe a renegociação com o FMI desta penalização cambial.

Conclusão: a ONU, que suponho não pode ser acusada de estar contra o Governo, defende que Portugal tem de renegociar a sua dívida, pois de outra maneira o processo de ajustamento terá consequências devastadoras para a economia e para a sociedade portuguesas. Será pedir muito a Passos Coelho, Vítor Gaspar e Carlos Moedas que leiam a entrevista que Artur Baptista da Silva deu ao caderno de Economia do Expresso a 15 de Dezembro?

Sobre o artigo de Nicolau Santos escreve, e muito bem, João Miranda:


1. Artur Baptista Silva diz o mesmo tipo de disparates que 90% dos comentadores que aparecem na TV e comentam nos jornais.
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2. No Expresso, Nicolau Santos tem propagado mais ou menos as mesmas falácias que Artur Baptista Silva semana após semana, ano após ano, sem que ninguém o acuse de ser burlão. Se perguntarem ao Artur Baptista Silva onde se inspirou, aposto que ele dirá que foi nas colunas de opinião do Nicolau.
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3. Não se pode esperar que um jornal em que o Nicolau Santos é o responsável pela secção de economia consiga distinguir um discurso económico com lógica de uma aldrabice.  Aldrabice é a cultura da casa.
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4. Ao longo de 2012, a discussão pública em Portugal andou à volta de variações das ideias de Artur Baptista Silva. Basicamente, não somos responsáveis pela nossa dívida e os alemães/BCE/FMI é que devem pagar a conta porque nós temos o direito adquirido de continuar a viver folgadamente. Não houve um editor de economia que não tenha caído nesta lógica.
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5. Ao longo deste ano a comunicação social divulgou de forma totalmente acrítica os maiores disparates.  Por exemplo, há menos de uma semana todos repetiram a tese do Ricardo Cabral de que a TAP valeria 1000 milhões de euros. Era disparate, mas era o disparate que todos queriam ouvir.
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6. No período que se seguiu ao anúncio do aumento da TSU os jornais escreveram todo o tipo de disparates: tabelas erradas, contas erradas, estudos mal amanhados, análises erradas, desinformação. Nenhum jornal conseguiu explicar em que é que a medida consistia e poucos jornalistas da área económica perceberam exactamente o que se pretendia. O resultado foi uma solução pior mas mais consensual.
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8. A comunicação social que aceitou como legítimo o Artur Baptista da Silva é a mesma que tomou por bons todos os estudos sobre SCUTs, OTAs, TGVs e afins  e que ajudou a vender a estratégia dos grandes eventos e do investimento em grandes obras públicas. É a mesma que apoiou a trajectória suicidária de Sócrates rumo à bancarrota e desculpou tudo com a crise internacional e as agências de rating.
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9. Recorde-se que a comunicação social deixou de falar do Krugman no dia em que ele cá veio dizer que Portugal tem que cortar na despesa.
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10. Este caso é uma espécie de caso Sokal do jornalismo económico português. A forma como estão a reagir indica que tudo continuará na mesma e que dentro de uma semana voltarão à mesma narrativa em luta contra qualquer reforma ou corte na despesa e de culpabilização da Alemanha e das agências de rating.



1 comentário:

menvp disse...

MEGA-BURLÕES:
- mega-burlões que controlam a comunicação social... procuram 'mil' vozes... com o objectivo de repetir mil vezes uma mentira... até ela se tornar uma "verdade".
[nota: mega-burlões descuidaram-se: uma das suas mil vozes foi apanhada - o burlão Artur Baptista da Silva]
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Anexo:
PRECISAMOS DE TODOS
-> Não precisamos de lamentações sistemáticas... precisamos é de bons mecanismos de controlo... e precisamos que todos os contribuintes estejam atentos.
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Explicando melhor:
- Anda por aí muita CONVERSA DE CONTRIBUINTE PAROLO que ainda não aprendeu com séculos e séculos de história: o conceito de «político governante» pressupõe um sistema muito permeável a lobbys... e aquilo que importa mesmo... é um sistema menos permeável a lobbys...
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-> Por um sistema menos permeável a lobbys... temos de pensar, não em «políticos governantes»... mas sim... em «políticos gestores públicos» que fazem uma gestão transparente para/perante cidadãos atentos... leia-se, temos de pensar em bons mecanismos de controlo... um exemplo: blog "fim-da-cidadania-infantil".