Percorro despreocupado a caixa de comentários do Portugal Contemporâneo e acabo ainda menos preocupado no grande inquisidor de Dostoevsky. Este brandia que o que os homens mais temiam era a liberdade de escolha. Entregues a si tresmalham-se e o único remédio, avisa, era entregarem-se obedientes e dóceis aos poucos capazes de suportar os ardores da liberdade. Não existe aqui qualquer conspiração dos poucos para dominar os muitos. É apreço pela humanidade. Espírito de missão. E foi em espírito de missão – deles – e de sacrifício – dos outros – em passo de dança com uma mão na anca e outra na ideologia, que canhotos e dextros aplicaram-se para levar a palma aos liberticidas de todos os tempos e locais. O partido, a igreja, o estado, a nação levantava dos ombros do homem comum – esse miserável sem préstimo – a responsabilidade, e tornava-os em escravos ordeiros e agradecidos. Sem obediência desinteressada estaríamos todos condenados aos padecimentos e sevicias da lucidez dos solitários – duplamente solitários – às portas do niilismo. Não são os ferros a ilusão, é a desilusão que nos põe a ferros. A sociedade ordeira e ordenada do sonho dos fanáticos pede sempre a liberdade das jaulas. Mais expeditos para coreografias da turba, do homem-multidão. E nem sempre é preciso os rigores do fanatismo para pedir-se o pior. Restaurar velhos trapos hegelianos – velharias do sótão colectivista – é apenas um dos passos.
“Semelhante elevação de toda espécie de egoísmo até ao infinito, até ao desaforo, não pode ser estigmatizada com suficiente desprezo.”
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