Teste

teste

sábado, 15 de agosto de 2009

Jornalismo à base de "bom senso"


Nicolau Santos, director do Expresso, é um tipo que me irrita. Não só porque não partilha da minha visão liberal da sociedade (mas não seria por aí...) mas também por ser um indisfarçado admirador das ideias emanadas pelo aparelho socialista e por, sendo economista, emitir opiniões nesta área que mais parecem saídas da cabeça de um taberneiro com o liceu terminado em 1962.

No seu editorial do caderno económico do Expresso de hoje, dá mais um ar da sua graça a propósito dos preços dos combustíveis e a sua correlação com o preço do crude. O chorrilho de patacuadas e lugares comuns resume-se neste par de frases:

«O foco foi colocado no mau funcionamento do mercado e a crítica dirigida à Autoridade da Concorrência (AdC), que estuda muito mas actua pouco. [...] Em qualquer caso, os custos fixos e a paridade euro/dólar justificam que contra a descida de 45%, os combustíveis nas bombas só tenham descido 6% a 10%?»

Não só Nicolau Santos não deveria - tivesse ele estudado um mínimo sobre o sector ou bastando ler o último relatório da Autoridade da Concorrência com atenção - estar espantado pelo diferencial entre taxas de crescimento entre crude e combustíveis nem com a conclusão do referido relatório.

As contas são simples para um comum mortal quanto mais para um economista que tem a obrigação de estar familiarizado com o conceito de elasticidade. Elasticidade entre duas variáveis que se correlacionam indica quanto é que uma varia percentualmente em virtude da variação de 1% da outra. A fórmula é simples

E_{x,y} = \left|\frac{% \Delta x}{% \Delta y}\right|,

que pode ser escrito como E_{x,y} = \left|\frac{\partial \ln x}{\partial \ln y}\right| = \left|\frac{\partial x}{\partial y}\cdot\frac{y}{x}\right|


Se assumirmos que X é o preço da gasolina e Y é o preço do rude, a elasticidade diz-nos qual a percentagem de variação do preço da gasolina em função da variação de cada 1% no preço do crude.

Olhando para o relatório da AdC no que respeita à gasolina IO95 pode ler-se que


preços em Euros/litro

Ou seja, Preço Crude = (Preço Petróleo + Act. Refinação + Armazenamento + Act. Retalhista + ISP)*(1+ Taxa IVA).

Fazendo as contas (se quiserem as contas detalhadas eu escrevo na caixa de comentários ou envio por e-mail) com base nos dados médios para 2008, e assumindo todos os itens como fixos à excepção do preço do crude, chega-se ao valor :

Elasticidade = Preço Crude / (Preço Crude + Parcela Fixa) = 0,42/(0,42+0,724) = 0,37

Ou seja, que por cada 1% na variação do preço do crude, o preço da gasolina varia 0,37%. Assim, uma variação de 45% no preço do crude implicaria uma variação da gasolina, em 2008, em torno dos 17%. Atenção que isto se baseia em valores médios. Se considerarmos valores iniciais mais baixos para o crude, o impacto no preço da gasolina é menor e vice-versa. Para chegar a esta conclusão bastava olhar para o quadro e ter em atenção que o preço do crude apenas representou, em 2008, 30% do preço da gasolina na bomba.

Fazendo um boneco:

(Para uma análise de longo prazo sobre este assunto, procurem os posts "Volatilidades" na Caldeirada de Neutrões)

Além destas lições de Introdução à Economia, Nicolau Santos esqueceu-se que a Autoridade é da Concorrência e não da Regulação. Espera-se que uma autoridade estude os assuntos que lhe competem e que ajam em coerência com os resultados desses estudos. É isso que acontece. Por mais que isso contrarie o "bom senso" de Nicolau Santos.

1 comentário:

Freire de Andrade disse...

Óptima demonstração. Clara e sucinta. Já tinha intuído esta explicação, mas vê-la preto no branco com fórmulas e gráficos, e com tanta lógica, é um prazer.