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quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Fundamentos da democracia

Por vezes há que voltar ao fio de prumo.
As conversas são como as cervejas, as ideias enrolam-se e às tantas as palavras já não significam aquilo que significavam.
Se acha esta introdução sofisticada, tem toda a razão, quer a ache boa, quer lhe pareça uma razoável merda, porque a palavra "sofisticado", é uma daquelas que tem hoje um significado exactamente oposto ao seu significado original.

Adiante!
Há dias assisti a uma conferência do Dr João Carlos Espada, sobre os Fundamentos da Democracia.
O Dr Carlos Espada usa a velha tecnologia de escrever no quadro e vê-lo ali, de pequena estatura, fato, lacinho e modos suaves, a tropeçar nos fios, capta a atenção e faz esboçar alguns sorrisos.
Depois ele começa a falar e a sua estatura aumenta e ocupa toda a sala. E o que diz , escreve e apaga, torna-se tão simples e claro que nos perguntamos porque é que nunca pensámos nas coisas daquela maneira.

Ah, sobre a democracia.
O Dr JCE falou essencialmente de Popper, Hayek ,Oakeshott e Leo Strauss.

A coisa é simples:

Há 3 formas de exercício do poder:
Monarquia, em que governa um
Aristocracia, em que governam alguns
Democracia, em que governam todos

Estas formas são como cores básicas....podem combinar-se em muitos cambiantes. E todas elas admitem variantes perversas:
A monarquia tem como variante degenerada, o despotismo,, a ditadura de um
A aristocracia, o governo dos melhores, degenera na oligarquia
A democracia tem como perversão, o "rule of the mob", no limite a anarquia.

Popper (A sociedade aberta e os seus inimigos) formula sobre estes conceitos um paradoxo notável:
Estas formas podem ser auto-destrutivas em si mesmas. Por exemplo, se se considerar que a melhor forma de governo é a monarquia, então o monarca pode decidir delegar poder em alguns ou em todos, isto é, a melhor forma de governo, no exercício da sua virtude, introduz formas de governo que são , nesta hipótese, "piores"

Claro que Popper considera que a melhor forma é a democracia, mas uma democracia que não seja transformável, na aplicação, noutras formas de governo.
Tem de haver limites e é aqui que ele diverge radicalmente de Rousseau, que pensava que a maioria do povo tem toda a legitimidade para decidir o que entender.
Os limites de Popper são , simplificando, a possibilidade de "despedir os maus", ou seja, as eleições, os direitos individuais, como esfera inviolável que nem a vontade de uma maioria democratica pode tomar de assalto, os "checks and balances" e, enfim, o "rule of law".
É a democracia constitucional, aquela que ainda vamos tendo, aquela que Louçãs, Chavez, Jerónimos e afins, consideram "burguesa", super estruturas que o capitalismo usa para sobreviver.

O que se está a observar na América Latina, a "chavização", é expurgado o fumo da retórica, uma rejeição da democracia constitucional, usando a máscara de Rousseau.
Introduz-se a paródia da chamada "democracia popular" que, obviamente, vai terminar, segundo o Paradoxo de Popper, em oligarquias, anarquias ou ditaduras.

Para acabar, onde é que entra aqui Hayek?
Hayek explicou ( e ganhou um Nobel por isso) que as sociedades onde o governo não controla tudo, a informação que circula entre os agentes é muito mais volumosa e rica do que a que é possível num sistema centralizado, onde os canais são verticais e de sentido único.
Por isso as sociedades centralizadas podem ser mais eficazes na realização de um objectivo concreto e limitado mas, a médio e longo prazo, falham no resto.
Por exemplo, a URSS propôs-se ultrapassar o Ocidente na produção de aço, e conseguiu-o, mobilizando os esforços da sociedade.
Mas quando o conseguiu, já o Ocidente tinha passado a usar plásticos em muitas aplicações, e o aço que produzia era melhor e mais barato.

Ou como aquela história verídica do responsável pelo abastecimento do pão a Moscovo ter, numa visita a Londres, ficado maravilhado com o facto de não só não haver faltas de pão, como ser possível escolher e comprar infinitas variedades de pão a qualquer hora do dia.
Quis contactar o seu homólogo londrino e abanou a cabeça, aturdido, quando lhe explicaram que ninguém era responsável, que não havia homólogo.

10 comentários:

Anónimo disse...

Monarquia, em que governa um.

ha sim, voltamos ao absolutismo.
enfim pensam que governam

EJSantos disse...

Bom texto. Faz me recordar Aristoteles a descrever as formas de Governo (ver "História das Ideias politicas, I, de Freitas do Amaral).

Anónimo disse...

e então vamos agora aprender filosofia politica.

RioDoiro disse...

"Quis contactar o seu homólogo londrino e abanou a cabeça, aturdido, quando lhe explicaram que ninguém era responsável, que não havia homólogo."

Esta frase dá para um tratado.

Bem esgalhado.

Paulo Porto disse...

O Espada publicou há uns três ou quatro anos um livro com o título "Riqueza e Pobreza", onde explica as razões para a existência de países mais ricos que outros, sempre baseado em estatística.

O caso português também está lá. Tudo assuntos e questões que aparentemente passam ao lado (ou por cima) dos políticos destes tempos, mais habilitados e propensos a entender e atender aos problemas dos Jorges Coelhos desta vida.

EJSantos disse...

"O Espada publicou há uns três ou quatro anos um livro com o título "Riqueza e Pobreza",

Arranja o link?

Paulo Porto disse...

@ejsantos

Aqui fica

http://www.wook.pt/ficha/riqueza-e-pobreza/a/id/110431

Eurico Moura disse...

Uma outra visão:
http://liverig.wordpress.com/2008/08/05/numero-de-pobres-cai-209-em-6-anos/

Eurico Moura disse...

Outra ainda:
http://www.portalbrasil.net/reportagem_cristovambuarque.htm

EJSantos disse...

Paulo Porto, muito obrigado.