Faleceu em Lisboa, no passado dia 14 de Julho, Hermínio da Palma Inácio, glorificado pela opinião publicada como um revolucionário artífice da liberdade a quem a democracia portuguesa muito deve. [...]
Antes de prosseguir, quero deixar claro que não conheci Palma Inácio pessoalmente, embora tenha lido, senão tudo, seguramente quase tudo o que sobre a sua personagem foi publicado. Adicionalmente, recolhi de quem o conheceu muito bem, informação insuspeita sobre o seu perfil ético. Essa informação foi-me dada por um General Piloto-Aviador ao tempo Chefe do Estado-Maior da Força Aérea, e a conversa teve lugar no seu gabinete de trabalho, onde eu procurava despacho para assuntos da sua exclusiva competência, sendo que um deles era a nomeação de um militar para um cargo no estrangeiro. [...]. Pediu o meu parecer pessoal e eu dei-lho, recomendando um deles que tinha uma folha de serviço exemplar, era reconhecidamente muito competente e pautava o seu comportamento por um elevado padrão ético. O Senhor General ouviu atentamente os meus argumentos [...] levantou-se da sua secretária e convidou-me a sentar [...].
“Senta-te aqui, tu és muito novo e eu quero contar-te uma história de como gente “muito competente” pode, ao mesmo tempo, ser extremamente perigosa”.
E contou-me ali a seguinte história de Hermínio da Palma Inácio.
Esse Senhor General era ao tempo capitão aviador na Base Aérea de Sintra onde Palma Inácio, com o posto de 1º Cabo, tinha [...] a responsabilidade da pequena manutenção[...] , funções que desempenhara de forma comprovadamente muito competente e onde conquistara a estima de todos os pilotos. [...].
Em 1947, já depois da sua saída, [...] um dos pilotos, ao passar a obrigatória inspecção exterior a um avião no qual iria voar de seguida, notou que os cabos de comando dos lemes do avião [...] estavam em mau estado, parecendo meio cortados. Dado o alarme e após pormenorizada análise, confirmou-se terem os ditos cabos sido, [...] intencionalmente serrados o suficiente para, com o avião ainda em terra, transmitir movimento aos lemes – e iludir o piloto - mas para inevitavelmente quebrar quando sujeitos à elevada pressão aerodinâmica do voo, deixando o avião no ar sem qualquer possibilidade de controlo, provocando a sua inevitável queda e destruição e a mais que provável morte de pilotos. E constatou-se ainda que tinham sido serrados os cabos de comando de todos os aviões, num acto de sabotagem total da frota, cuja autoria se confirmou ser de Palma Inácio que foi preso pela PIDE.
[...]
Ao elevado e generalizado apreço que a Força Aérea Portuguesa lhe demonstrou – depois de lhe ter proporcionado uma formação técnica de grande valia profissional [...], Palma Inácio retribuiu com a preparação da destruição material da frota de aviões de treino, [...] , com a frieza assassina de quem não hesitou em condenar à morte os seus camaradas pilotos, aqueles mesmos que tanta consideração lhe dispensaram.
[...] Palma Inácio podia simplesmente ter cortado os cabos de comando ou podia ter feito explodir os aviões. Mas isso não lhe bastou: quis também assassinar os pilotos!
Foi responsável por algumas imbecilidades como, por exemplo, a tentativa de ocupação da cidade da Covilhã, mas o imaginário nacional relembra-o essencialmente pelo desvio, em 11 de Novembro de 1961, de um avião Super-Constellation da TAP de onde largou sobre Lisboa panfletos contra o regime de Salazar, e também pelo [...] assalto à dependência do Banco de Portugal na Figueira da Foz, de onde roubou vinte e nove mil contos, uma elevadíssima quantia para a época. [...] Levou o dinheiro para Paris, para o banquete da fauna desertora e são conhecidas as desavenças que a farta refeição provocou, porque o objectivo não era envergonhar o Regime, era encher a gamela.
Como terá dito Mário Soares, Palma Inácio “Era um homem de grande imaginação revolucionária. Não era propriamente um político…”. Tem toda a razão e por isso os seus actos não põem ser considerados “políticos”. De facto, durante todo o período da “ditadura” não se lhe conhece [...] qualquer projecto alternativo de governação que pudesse legitimar uma oposição ao Regime [...]l.
Foi só depois da Revolução de Abril que Mário Soares o convenceu a filiar-se no Partido Socialista e, de seguida, lhe ofereceu [...] o lugar de Director-Geral do Ministério do Trabalho. [...] Favores de amigos.
[...] Almeida Santos, Presidente do Partido Socialista, declarou que Palma Inácio foi “…um exemplar patriota” e terá sido por este mesmo critério que Jorge Sampaio, em Maio de 2000, quando exercia as funções de Presidente da República, o agraciou com o elevado grau da Grã-Cruz da Ordem da Liberdade.
Perante tudo isto, ocorre-me perguntar se eu [...] decidir assaltar uma qualquer dependência do Banco de Portugal e roubar pelo menos uns cinco milhões de euros, o que me dava um jeitão [...] ; se eu que, tal como Palma Inácio tinha, tenho acesso fácil a qualquer Base Aérea nacional, decidir sabotar e destruir o avião Falcon em que o Governo se passeia por esse mundo à nossa custa e atentar contra a vida de uns pilotos, [...] será que o Partido Socialista me confere a distinção de me considerar um “exemplar patriota”, me arranja um lugar bem remunerado no conselho de administração de um desses Institutos Públicos para onde é desviado o dinheiro dos contribuintes para aí ser gerido por “exemplares patriotas”, como na opinião publicada se pretende fazer crer que Palma Inácio foi, e depois - a cereja no cimo do bolo – me confere aí um grau qualquer da Ordem da Liberdade?
A verdade, [...] é que Palma Inácio não prestou qualquer serviço ao País, por muito que isso doa aos desertores que tudo torcem para justificar a sua deserção, a sua traição à Pátria. Posto em termos simples e claros e entre outras coisas:
-Palma Inácio foi um mero ladrão – procurei mas não consegui encontrar outro adjectivo para qualificar uma pessoa que assalta um banco e rouba vinte e nove mil contos - com os quais muitos se devem ter banqueteado e, porventura, se sentem agora na obrigação de o glorificar em termos nacionais.
-Palma Inácio traíu a Força Aérea, tentou o homicídio dos mesmos pilotos com quem lidou diariamente e que lhe dispensaram uma consideração que não merecia, constituindo-se homicida na forma tentada.
-Mais tarde, já no Brasil, aproximou-se do Senhor General Humberto Delgado (o mesmo que lhe dispensou a consideração pessoal de o levar a voar) tornou-se membro do MNI e na hora certa traiu-o também, o que obrigou Humberto Delgado a “…expulsá-lo «por traição…”
Ora… façam-me o favor de parar com o sistemático branquear da História. A traição não é, nem nunca será, convertível em virtude. Haja vergonha!
Espanha, 20 de Julho de 2009
Fernando Paula Vicente
Major-General da Força Aérea Portuguesa (Ref.)
4 comentários:
Lidador:
O homem era um revolucionário romântico. Você é que não percebe nada dessas coisas...!
Com a escumalha da nação a governar vêm-se os resultados...
Vêm-se os resultados, não se vêem é resultados...
Oferecem pois, mas só se o fizer contra o aquecimento global.
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