Teste

teste

quinta-feira, 3 de maio de 2012

A minha avó....


 
José Gonsalo,


Gostei do seu comentário. Desta vez, para variar e ao contrário do Lidador, teve pena de mim e abdicou da doutrina, não me fustigando com ideologia ou com a Escola da terra das salsichas. Optou pelo lado humano, ousou mesmo dar um exemplo da sua família.

Diz-me que os seus avós eram mais modernos do que estes tristes. Fantástico. Os meus avós não eram. Não sei se isto se deve a uma diferença de classe ou geográfica entre os nossos familiares… Sei no entanto que a relação entre o meu avô e a minha avó estava a anos luz de distância da deste casal brasileiro. (Os meus pais idem!)

Aos nove anos de idade o meu avô já trabalhava numa fábrica de tijolos em Vila Nova de Gaia, que eu, muitos anos mais tarde ainda conheci em ruína. Nunca frequentou uma escola, aprendeu a ler na fábrica com militantes anarco-sindicalistas nos momentos de descanso com a gamela da sopa entre as pernas. Mais tarde, o seu carácter romântico e rebelde obrigou-o, quase naturalmente, a seguir a militância política.

A política obrigou-o a deixar a família, fugindo para Espanha. Em Espanha combateu na Guerra Civil e, como a Republica perdeu, o meu avô lá teve que fugir outra vez. Desta vez para Marrocos. E por aí ficou durante dez anos sem a mulher e os filhos (entre eles a minha mãe), e sem responder às cartas de Portugal que a minha avó enviava constantemente.

A minha mãe, também uma mulher do seu tempo, contava sem ressentimento que enquanto eles em Portugal passavam fome o meu avô passou uns fantásticos dez anos em Marrocos. Montou uma empresa, mantinha os seus contactos políticos com refugiados espanhóis e portugueses, e gajas não lhe faltavam. Quando as europeias escasseavam – note que Marrocos na altura era uma protectorado francês – as burcas também marchavam. Conta-se na família (em segredo e com vergonha) que ele, nestes seus contactos com os locais, fez um filho a uma moura (a expressão familiar) casada com um empregado dele. O meu avô subornou o cornudo e a coisa ficou em águas de bacalhau. Os mouros nessa altura tinham mais medo dos patrões do que de Alá.

Resumindo, que isto já está a ficar muito longo, o meu avô, apesar de ser muito de esquerda (anarco-sindicalista), não se parece nem um bocadinho com o homem do filme, como pode imaginar. Passados dez anos e devido a pressão exercida por familiares influentes e até mesmo pelo Cônsul francês, o meu avô lá resolveu receber a família em Marrocos.

Mas a minha avó, coitadinha (talvez por ser de outra classe social) não era como a sua. Sofreu e calou assim como 99% das mulheres portuguesas da sua geração. E se estivesse com problemas de estômago à mesa, não se queixava, levantava-se e ia padecer para outro sítio. Porque se o fizesse, o meu avô virava a mesa ao contrário e, estivesse quem estivesse, ia tudo à frente dele: os pratos, as panelas, os filhos e as filhas. E se o seu avô estivesse presente, ou mesmo até a sua avó, também levavam nos cornos…

Depois da tempestade passada, a família já mais calma, o meu avô já sorridente, sabe o que é que o meu avô tinha por hábito perguntar a mim e ao meu irmão - crianças de 7-8-9 anos de idade?

  Ó rapaz, o que é que é pior que uma mulher?

A resposta que o meu avô esperava de nós e que iria fazer rir os adultos (homens) já nós sabíamos de cor: - duas mulheres… 

O meu avô, apesar das suas crenças ideológicas, era um homem do seu tempo. Não quero com isto dizer que hoje em dia não existam homens como o meu avô. Existem e eu até conheço alguns. O que já vai escasseando, e ainda bem, são as mulheres como a minha avó.

Diz-se na família que eu herdei o temperamento do meu avô! Não creio, talvez apenas o gosto pela política e pela polémica, até porque nunca nenhuma mulher teve medo de mim! E a minha mulher, quando a conheci, já era (graças ao marxismo cultural ou à Escola de Frankfurt ou a grande puta que os pariu a todos), uma náusea emancipada muito parecida com a mulher do filme. Tão diferente da minha avó. E eu revejo-me perfeitamente naquele troncho, naquela repelência vertebrada mas humana do filme, e com muito gosto. Infelizmente tão diferente do macho latino com um quadro mental do século dezanove sonhando ainda com êxtases ao luar e com mulheres submissas – mas sem véu islâmico, por questões doutrinárias…


3 comentários:

Paulo Porto disse...

CdR esta sua escrita lembra a do Luiz Pacheco. No caso, isto estah melhor q algumas coisas q li dele, de outras não.
Como ja lhe disseram, vc devia escrever.

Unknown disse...

Se bem percebi, o seu avõ tratava as mulheres à bruta, sem respeito e consideração.

O que me espanta é que o CdR, hoje, com essa experiência vívida em mão, ache que tratar as mulheres com educação, sensibilidade e cortesia é, foi você que o disse, uma sublimação da brutalidade.

Resumindo, tratar as mulheres rudemente, é mau.
Tratá-las civilizadamente, é ainda pior porque, no mundo ideológico do CdR, a cortesia é brutalidade disfarçada.

Uma coisa é o seu contrário, porque a ideologia lhe diz que sim.

Espantoso!

José Gonsalo disse...

CdR:

Só ontem à noite vi este seu post. Responder-lhe-ei logo que possa.