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sexta-feira, 2 de julho de 2010

Saramago, Pound e Heidegger: ideologia e literatura


Da revista Sibila, transcrevo o que se segue:

Em meio às previsíveis louvações a Saramago por sua morte, falou-se tanto de sua obra (ainda que relativamente pouco de seus méritos linguísticos próprios – porque de fato poucos –, ou elididos ou substituídos por adjetivos altissonantes) quanto de sua “lucidez”, “coerência”, “firmeza” ou “sensibilidade”. Trocando em miúdos, seu comunismo. E ainda que alguns veículos tenham dado destaque negativo, por exemplo, a seu acrítico apoio ao governo cubano, a maioria das manifestações ou edulcorou sua ideologia ou a desconsiderou (coisa que ele próprio jamais fez). Mas se em vez de comunista ele fosse fascista, tal fato também teria sido assim edulcorado? Na verdade, não. Teria sido descaracterizado. A diferença é importante.

Edulcorar é adocicar, amenizar, positivar. Saramago era então comunista não porque fosse antidemocrático, muito embora, por ser comunista, fosse antidemocrático, mas porque era “comprometido com seu tempo” (desconsiderando a morte histórica do comunismo) e “sensível à injustiça” (desde que não de responsabilidade de ditadores de esquerda). Já descaracterizar é negar um caráter, uma característica. Assim, quando se tornou necessário explicar o apoio de Pound ao regime de Mussolini sem considerar seu apoio ao regime de Mussolini, ele foi diagnosticado como louco, o que antes jamais fora, nem na vida privada nem na pública. Algo equivalente se passou e se passa com Heidegger em relação ao nazismo. Pois aceitar que Pound tenha sido fascista e Heidegger nazista cria um problema epistemológico e outro pessoal aparentemente insolúveis. Em termos pessoais, como posso admirar ou respeitar a obra de um fascista? Em termos epistemológicos, a obra de um fascista não deve ser ela mesma fascista, em algum grau? O que nos devolve ao problema pessoal: como posso admirar ou respeitar uma obra com elementos fascistas?

A questão, porém, não se coloca para obras de comunistas como Saramago. Pois não apenas se pode como, segundo muitos, deve-se não só respeitá-la como ainda admirá-la.

Não tenho nada contra a se respeitar e admirar a obra de um estalinista. Pois entendo que a obra de um estalinista será respeitável e admirável em algum grau, se for afinal em algum grau admirável e respeitável, a despeito de seu autor, e não devido a ele – como, da fato, alguns argumentaram em relação a Saramago. O mesmo, portanto, deveria valer para um fascista, ao menos no caso de um fascista artista – do mesmo modo que Saramago era um comunista escritor. Ainda que não para um artista fascista – ou para um escritor comunista, ou seja, realista-socialista. Tampouco para um pensador fascista, por este não poder se diferenciar de um fascista pensador. Enfim, se Saramago e Pound, assim como García Márquez e Borges, podem ser lidos sem maiores questionamentos (a não ser quanto às diferenças verdadeiramente irredutíveis entre suas respectivas qualidades artísticas), o mesmo não vale para Heidegger, porque um filósofo lida com conceitos, assim como a ideologia.

Porém isso não acontece. O fascismo de Pound foi simplesmente negado, já em seu tempo, por sua conveniente loucura pós-Segunda Guerra, e o direitismo de Borges foi, enquanto vivo, fortemente repudiado, tendo sido, em termos práticos, o fator responsável por ele não haver ganhado o Nobel, ao mesmo tempo que um escritor latino-americano de estatura literária infinitamente inferior, mas devidamente de esquerda, Gabriel García Márquez, o recebia. Premia-se, em mais de um sentido, o escritor de esquerda, e condena-se, de mais de uma forma, o escritor de direita. Porque, como dito, ser de esquerda se pode, e talvez mesmo se deva, mas ser de direita não se deve nem se pode. Por isso mesmo, ser um escritor de esquerda não faz mal algum à carreira literária, muito ao contrário, enquanto a um escritor de direita só é dado se impor pelo caminho estreito do puro mérito.

O problema é que tanto a esquerda estalinista – caso do próprio Saramago – quanto a direita fascista – caso de Pound, mas não de Borges – são igualmente antidemocráticas. Não obstante, seu antidemocratismo não é percebido do mesmo modo. Daí um ser edulcorado – como no caso de Saramago – e o outro ser repudiado ou descaracterizado – como no caso de Pound. Há, então, o antidemocratismo aceitável, o da esquerda, e o antidemocratismo inaceitável, o da direita.

A questão não teria sentido caso o direito fosse concedido pela própria esquerda – que, ao menos a revolucionária, não é democrática, mas favorável à ditadura do partido único. Porém a fonte do direito são aqui os próprios democratas, o que torna a questão tanto mais precisa quanto surpreendente: por que, afinal, setores progressistas das sociedades democráticas toleram o desdém à democracia à esquerda?

A resposta, ou melhor, as respostas, além de múltiplas, são relativamente fáceis, ainda que talvez insuficientes. Em parte, a questão é teleológica: o socialismo traria no final a redenção, ao contrário do fascismo, que não traz nada além de si mesmo. Em parte, é o discurso das intenções sobre a realidade dos fatos: eles são no fundo bons, como pretendem, apenas cometeram erros. Em parte, são razões históricas: depois dos processos de Moscou, em que Stálin eliminou a nata da Revolução Russa, da perseguição a anarquistas e trotskistas na guerra civil espanhola e do pacto nazissoviético, a esquerda como um todo se engajou francamente na luta contra o nazifascismo. Em parte, é a aura romântica do voluntarismo: Trótski, Che etc. Em parte, é porque a esquerda representa a rejeição ao capitalismo, do qual os democratas gostam, mesmo porque gostam do conforto capitalista, mas do qual muitos não gostam de gostar.

Pois ao menos desde meados do século XIX, mais precisamente, desde 1848, com a publicação do Manifesto comunista, o capitalismo é apontado como o mal maior, o maior mal possível, para cuja supressão todos os meios, portanto, são bons.

Menos, talvez, o genocídio. Os milhões de mortos por Stálin, as dezenas de milhões mortos por Mao Tse Tung e o milhão de cambojanos mortos por Pol Pot, entre tantos outros, tornaram então o estalinismo, também conhecido como “socialismo real”, ainda mais inaceitável do que o próprio capitalismo e sua tradução política paradigmática, a democracia liberal. Não se trata mais, assim, de afirmar as qualidades irresistíveis do capitalismo, como fazem os liberais e os direitistas, mas de simplesmente não negar os vícios, maiores e piores, do “socialismo real”.

Em suma, o “socialismo real” deixou como herança histórico-político-ideológica a necessidade de escolher entre o ruim, o capitalismo e a democracia liberal, e o pior, o próprio “socialismo real”, com sua mistura tóxica de inépcia econômica e opressão política. Sendo assim, o ruim é naturalmente melhor.

Ocorre que o ruim, se melhor, é também real. Já o mito da bondade “essencial” da esquerda, pelas prováveis razões expostas acima, como todo mito, tem uma inércia própria, ou seja, impermeável aos fatos, e na verdade desgostosa deles, ou não se necessitaria de mitos. Enfim, o mito é, por construção, sempre “melhor” do que a realidade. Saramago que o diga.


Luís Dolhnikoff

24 comentários:

Anónimo disse...

Vira o disco e toca o mesmo.
Uma brevíssima biografia, e um roteiro minimamente aliciante sobre a obra de Saramago, o seu significado, impacto e objectivos, pode ser encontrado em:

http://www.ipv.pt/millenium/pers12_sar.htm

Greetings earthlings.
Ninja das Caldas (aka. Aac)

RioD'oiro disse...

"Vira o disco e toca o mesmo."

Nos paraísos socialistas adorado por Saramago e adorados pelos adoradores de Saramago, não viraria, nem haveria disco, nem haveria forma de tocar se o disco e o gira-discos não fossem dados pelo capitalismo.

E dir-se-ia ainda: se eles o dão é por óbvio interesse deles. Têm alguma na manga ou é para nos fazerem sentir que o nosso regime é inferior (como se não fosse exactamente e também por isso).

RioD'oiro disse...

.., e a autorização para ouvir e virar teria que emanar dos iluminados da casa de "telhado de vidro".

Fica em aberto se na diminuta percentagem de energia gerada nos "meios de produção" do regime haveria uma fatia disponível para ligar o aparelho. Parece que essa malta tinha "excelentes" sistemas de distribuição (de tudo quanto é coisa) mas sem nada para distribuir ... a não ser porrada e morte.

Anónimo disse...

No paraíso comunista, que os fascistas sociais (vulgo democratas coreanos, como o Bernardino e o seu chefe e os que aqui orneiam contra a democracia)era-se fusilado, depois de convenientemente preso e sovado, com a frequencia que os amanhãs que cantavam (mal) queriam.
Eram assassinos expressos. Estes daqui são assassinos potenciais.
Não lhes facilitemos a tarefa.
Não passarão.

Manuel Allzana

Anónimo disse...

Assassinos funcionais... não passarão... que bonito...
Dá quase vontade de chorar de emoção... ó Allzana, acreditas mesmo nisso? Vê lá é se o oxigénio está a passar todo...

Anónimo disse...

estes idiotas ainda andam nesta

Anónimo disse...

"Vira o disco e toca o mesmo."
Pela expressão, você já é entradote. Bastante entradote. Pelo que tenho lido, a senilidade...

Anónimo disse...

Oh Mija na Fralda, o Saramago também já não muda e os que emolduraram o Nobel, esses ainda menos...
A vida é assim, tão triste como tu, pá.

Anónimo disse...

"Dá quase vontade de chorar de emoção..."
Chora, filho, chora que aindas chegas a presidente. Socialista.

Anónimo disse...

Tretas e tretas e mais tretas. Três quartos do artigo é a explicar, muito despeitadamente, porque é que o Saramago, porque era comunista, não podia ser bom escritor. Ou o Garcia Marques.
O resto é a lamúria habitual dos ‘vencedores morais’ de festivais, que nunca ganham por causa da ‘política’. Ressentimento por parte de uma facção ideológica que não produz nada que seja reconhecido internacionalmente ou que é abandonada por quem é capaz de ir mais longe e vê no que está metido.

Roam-se, que ainda têm muito para roer. Têm uma vida inteira.

Anónimo disse...

"Três quartos do artigo é a explicar, muito despeitadamente, porque é que o Saramago, porque era comunista, não podia ser bom escritor. Ou o Garcia Marques."

Ai foi só isso que conseguiste ler no artigo, pobre diabo?

Anónimo disse...

Eh pá, diabo ainda vá! Mas pobre?
Despeito.

José Gonsalo disse...

RioD'Oiro
O autor fala daquilo que aqueles que mais o elogiam referem como o principal em Saramago: a sua postura cívica e política, os seus pergaminhos de "humanista". E depois esta corja vem dizer que o homem, coitado, só é atacado por ser comunista. Pois se é disso e quase nada mais que os seus homenageadores e defensores falam...!
Também é um facto que o resto lhes passa ao lado... Aliás, para eles, isso é perfeitamente secundário. O que é preciso é dizer-se que há "grandes homens", "grandes figuras" do lado deles.
Esta gente é viscosa...! Já houve por aqui quem lhes chamasse caniches e galinhas. Pela minha parte, chamar-lhe-ia hienas. Condiz mais com a postura.

Anónimo disse...

Não sei se és pobre, diabo. Sei é que és uma pobreza. De espírito.

Anónimo disse...

Não se justifique tanto, José Hiena, quem muito se justifica desacredita-se.

Anónimo Inimigo: DESPEITO!!!!
A realidade é incontornável: a vós e à vossa riqueza de espírito ninguém dá nem uma carica como prémio.
Continuem roer-se!

Vai retorquir como José Hiena ou como Rio'Pechisbeque?

Anónimo disse...

O que é que caíu sem que os burgueses disparassem um tiro? O paraíso comunista.
O que é que se está a ir abaixo, sem ser preciso senão rir de desprezo? O paraíso fidelista. O que é que se vem, sem se vir, abaixo por fome e miséria? O paraíso coreano dos amigos do Bernardino.
E depoiis de tanta borrada ainda há quem tenha o desplante de festejar o comunismo e os saramaguejantes bandalhos?
Imbecis? Não. Apenas canalhas sem caco. A diarreia da humanidade.

Nereu

Anónimo disse...

Gonsalo:
Você esqueceu-se de mim. Qual galinha, qual caniche, qual hiena. Eu disse que eles têm mentalidade de "gaja". E mantenho.
O Bairro Alto já era o Centro de Trabalho da Revolução. Agora já abrem bares de alterne. E as funcionárias fazem horas voluntárias para o Partido nas caixas de comentários dos blogs, entre uma ou outra passita. Depois, neste estado, admiram-se de só dizerem parvoíces...

Anónimo disse...

"Nereu"

Pelo menos não deve ser o Rio'pechisbeque, esse não alinha duas palavras em condições. E não esqueçamos um ou dois dos mais 'inteligentes', que têm temática própria, como o 'gaja de alterne'.

Mas Anónimos Inimigos são todos.

RioD'oiro disse...

"Qual galinha,"

Galinha não é mau de todo. A não ser que o caro anónimo dê razão aos porcos.

Anónimo disse...

Oh seus bardamerdas tenham respeito pelos animais, não os ofendam, porque eles não comungam da vossa irracionalidade patológica.
Ide escrever bloguinhos bestas, para o rais que vos parta.

RioD'oiro disse...

"não comungam da vossa irracionalidade"

Não senhor. Tem razão. São racionais como o caro anónimo.

Anónimo disse...

"Ide escrever bloguinhos bestas"
Então depois dessa conversa toda ofendes as bestas, quer dizer, os animais? oh meu irracional patológico... oh minha besta! :P

Anónimo disse...

"Não se justifique tanto, José Hiena"
Olhem bem para isto! O Gonsalo fala em hienas e este gajo chama-lhe logo José Hiena! É ou não é como as criancinhas com aquela do "quem diz é quem é o teu pai é jacaré"?
Que idade terá este marmelo? Pelos vistos, ainda não lhe deu para arranjar juízo.

Anónimo disse...

Mas que dupla de idiotas, vai a todas.