Hafid Bouazza (1970), o autor deste artigo, é um escritor e ensaísta de origem marroquina que vive na Holanda desde os 7 anos de idade. Já publicou vários livros que foram premiados. Ao lado desta actividade traduz poesia e escreve peças de teatro. O link: http://loorschrijft.web-log.nl/verwondering_is_het_begin/2009/12/minaretten-als.html#more
A notícia é recente e as consequências são imprevisíveis, mas a reacção do mundo muçulmano já cá canta e é precisamente como se esperava. Estou a falar do resultado do referendo na Suíça contra a construção de mais minaretes; um pouco mais de metade votou a favor da proibição. Um resultado inesperado mas importante.
Como de costume, quando há algo de humorístico da parte do Islão, nunca é essa a intenção.
«Não somente esta proposta deve ser vista como um ataque à liberdade religiosa, mas também como uma tentativa de insulto à sensibilidade da comunidade muçulmana dentro e fora da Suíça», afirmou o influente grande mufti, xeque Ali Gomaa.
Pelos vistos o xeque Ali Gomaa é um grande defensor da liberdade religiosa. É bom sabermos. Os coptas e o bahais – que não têm qualquer tipo de protecção no Egipto – certamente que o têm em grande consideração.
E como organizações judaicas e cristãs na Suíça fizeram um apelo à população para votar contra a proibição, certamente que agora o Grande Mufti vai redobrar esforços em prol destas minorias. Não como uma questão de reciprocidade, coisa inexistente no Islão, mas por causa da pretensa similitude entre as religiões monoteístas que nos é constantemente, mas debalde, martelada. Esta bigorna já está cheia de moças…
Será que os muçulmanos vão sentir qualquer dificuldade na sua prática religiosa porque as futuras mesquitas não vão ter minaretes? Será que as preces só são ouvidas por Alá quando declamadas a partir de uma torre que pode rivalizar com a de Babel? Claro que não. Houve então receio (nem me atrevo a pensar nisso) que iria ser necessário arranjar outras torres bem altas para atirar sodomitas de cabeça para baixo?
Já me esquecia. Foram mais uma vez ofendidos os sentimentos da comunidade muçulmana.
Agora a sério.
Apesar da minha aversão a proibições em geral, mas desta vez não consegui reprimir uma certa alegria ao ouvir as notícias. Claro, trata-se de um acto simbólico: a nível prático não é colocado nenhum entrave ao Islão.
Uma proibição aos minaretes não é uma proibição a uma prática religiosa. Mas uma decisão simbólica deste tipo é importante, porque, deste maneira, é travado o avanço simbólico do Islão. Todos nós sabemos o valor que os muçulmanos dão ao aspecto exterior, à matéria, à pedra, ao véu, e também ao minarete.
Mas se não me engano e se bem reparei durante o último Ramadão na Tv, nos jornais e na internet, para os muçulmanos o importante é a espiritualidade do Islão, a experiência interior. E a este respeito o minarete nem adianta nem atrasa. Um minarete é um depoimento, que ele não seja apreciado por toda a gente é compreensível.
Quantas vezes não ouvimos, cada vez que uma nova mesquita ia ser construída, que esta iria ter o mais alto minarete da Europa? E porque razão? De onde vem esta compulsão para ‘o maior’? (Quem foi afinal que escreveu acerca dos minaretes que ‘eles se erguem como orgulhosos manguitos’)
Eu penso que se trata aqui de ênfase e triunfalismo. É um marco bem alto, uma vitória para a visibilidade do Islão. E tendo em conta os países onde vivem os financiadores isso não me parece estranho.
O que é que a mesquita faz em prol da sociedade? Eu já escrevi sobre isto: se as mesquitas, juntamente com as igrejas, acolhessem refugiados, dessem abrigo a desalojados, oferecessem refúgio a mulheres batidas, então toda a sociedade beneficiaria. Desta forma a mesquita seria funcionalmente integrada na comunidade. Um diálogo inter-religioso de vez em quando não é suficiente; é uma fantochada de boas intenções.
Tariq Ramadan disse que foi uma decisão ‘catastrófica’ (não faz a coisa por menos!) motivada pelo medo. Mas mesmo que assim fosse, não será esse medo legítimo? Todos os apologistas com melodiosas historietas sobre a universalidade do Islão, todos os disparates sobre a contextualização das partes obscuras do Corão (‘a coisa tem que ser vista no seu tempo’) não conseguiram, pelos vistos, dissipar o medo. E isso nada tem a ver com a chamada ‘islamofobia’ vigente, tem a ver que o povo suíço não quer ser mais uma vez ludibriado.
Podemos andar de ‘iftar’ em ‘iftar’ [primeira refeição que quebra o jejum do ramadão] e com a pança repleta e um sorriso de compreensão calçar de novo os sapatos à porta da mesquita; mas tudo isso não impede as pessoas de já terem compreendido que estas ocasiões não passam de folclore – e na pior das hipóteses trata-se de uma palhaçada. Não substitui a realidade do dia-a-dia.
Que não se trata de islamização é imediatamente contradito pela atitude das autoridades suíças, que receiam repercussões nos países islâmicos e o perigo de radicalização de jovens muçulmanos.
Estar refém da ‘susceptibilidade muçulmana’ é uma forma de islamização.
Contra isto é que o povo suíço votou. Não mais Islão visível. Quantas iniciativas de integração através de mesquitas já falharam na Holanda? Lembro-me da ‘Poldermoskee’ [Mesquita dos Polders – Amesterdão] (pouco pólder, muito deserto) e da Westermoskee [Mesquita Ocidental - Amesterdão].
E no lugar de mais uma iniciativa através de uma mesquita, com ou sem minarete, o melhor seria haver um período de ponderação. Porque o que a Europa (e até mesmo os muçulmanos) precisa não é mais Islão, mas precisamente menos, muito menos.
10 comentários:
Já cá faltava a «guerra de civilizações» que tantos proveitos tem dado ao complexo-militar-petrolífero americano. Soldier on, Carmo da Rosa, soldier on!
Os que se manifestam no ocidente pela defesa da sua cultura, civilização e valores são sempre rotulados de extrema-direita, fássistas e outros adjectivos que a nazo-esquerda bafienta e militarista usa, à falta de qualquer argumento decente ou semi-inteligente.
Ola Carmo da Rosa.
Excelente texto.
"Quem divide inovação [na religião] em boa inovação (bid'ah hasanah) e inovação pecadora (bid'ah sayyi'ah), então, fez mal e contrariou o Mensageiro (sws), que disse “Toda a inovação é desvio”. Ou seja, não existe nem boa nem má inovação, existe desvio sempre que existe inovação..."
Para lerem mais destas maravilhas da religião da paz, podem ir ao
http://safyiah.blogspot.com/
Uma da razões porque os minaretes são insultos, é por isso mesmo, são uma inovação.
Não mais Islão visível.
Nem vou falar em ‘tolerância’, isso não tem por aqui qq eco, vou antes falar de erro crasso ou golo na pp baliza. E se é difícil assacar esse erro a uma estrutura concreta - resulta do sistema de democracia directa que existe na Suíça - ninguém tem dúvidas em apontar as responsabilidades à agenda da extrema-direita. Labaredas.
E assim estou cada vez mais convencida de que os resultados práticos do referendo suíço vão resultar em nada, agora que a comunidade judaica internacional entrou na dança. Primeiro, uma a uma, foram-se ouvindo vozes um pouco por todo o mundo a protestar contra esta segunda vaga de anti-semitismo. Agora a ultrapoderosa Anti-Defamation League, que decide o que é verdade e mentira sobre os judeus e o holocausto, resolveu dar um ar da sua graça e avisar o governo suíço de que não se lembre de pactuar com a extrema-direita (até dá vontade de rir, mas seja). E se de alguma coisa os judeus entendem é dessa ‘invisibilidade’ que quer ver aplicada às mesquitas. As sinagogas tb tiveram que se ‘invisibilizar’ durante séculos.
No dia 29 de Novembro a comunidade muçulmana foi vítima de uma campanha populista de intolerância religiosa, liderada pela extrema-direita do SVPO.
Não foi a primeira vez que o voto popular suíço foi usado para promover a intolerância religiosa. Há um século um referendo baniu o ritual judeu da matança numa tentativa de escorraçar a sua população judaica. Nós partilhamos as preocupações da Federação das Comunidades Judias Suíças de que esses que iniciaram a campanha antiminaretes podem tentar acabar com a liberdade religiosa através de meios semelhantes.
Quer dizer, este filme é uma chatice. Ou se troca o enredo, ou o enredo se revolta contra o autor. Depois da apreensão sobre os dinheiros muçulmanos, já só faltava a ameaça de fuga das poupanças judias.
Sr. Carmo, não me recuso a ver nada. Sou míope mas não sou cega e não vou repetir o que já disse ene vezes.
Do que aqui trato, porque falar de tolerância é mesmo um diálogo de surdos e eu até nem gosto da palavra, é de medidas estúpidas e manhosas, quem as incita não quer nada do que o dom Carmo diz querer. Isso até os judeus – ou principalmente os judeus – vêem. E andam pouco sossegados, embora intuam que existe pouca disposição para avançar com esta aberração.
O novo anti-semitismo ainda é o velho anti-semitismo e eles costumam ser os primeiros da fila. E se vir bem, nem a conversa mudou, é só fazer algumas pequenas adaptações ao que já se conhece de outros carnavais e transpor. Nem o Eça, o nosso Eça, apreciava lá muito a visibilidade pública dos judeus e ele nem anti-semita era.
Há um texto de Uri Averny que acho particularmente interessante e que resume o que move essa gente.
Os suíços decidiram por referendo proibir a construção de minaretes. Isto é mau. É abominável.
O anti-semitismo parece que se deslocou de um povo semita para outro. Na Europa pós-holocausto é difícil ser-se antijudeu, e assim os anti-semitas tornaram-se antimuçulmanos. Como dizemos em hebraico, a mesma senhora com um vestido diferente.
De um ponto de vista estético, é uma decisão estúpida. […] Mas não se trata de arquitectura, antes de racismo brutal e primitivo, aquele a que os alemães tentam escapar. Os suíços também têm muito de que se penitenciar. Já os seus avós se portaram miseravelmente durante o holocausto […].
[…] O referendo abre as portas aos mais vis dos demagogos, os discípulos de Joseph Goebbels, que uma vez escreveu: ‘Temos que apelar de novo aos instintos mais primitivos das massas'.
Jean-Paul Sartre disse uma vez que todos somos racistas. A diferença, disse, é entre aqueles que o reconhecem e lutam contra o seu pp racismo, e aqueles que se submetem a ele. A maioria dos suíços, lamento dizê-lo, falhou o teste. E nós?
Pode ler o texto completo aqui.
http://www.avnery-news.co.il/english/index.html
Estou com alguma curiosidade acerca da opinião da Ester Muznick, também sempre muito chegada ao mata-e-esfola. Mas quando o fogo nos chega às canelas…
Mas pronto, como diziam os republicanos, ‘no pasarán’. Esperemos de que desta vez não se enganem.
Olhe, acabei por esquecer-me de responder ao principal.
Eu sei que o texto não é seu, ainda consigo ler qq coisita, mal, mas tb sei que tem o seu aplauso, por isso o transcreveu para aqui. Daí a minha resposta não ser mal direccionada.
Além disso, já disse o que penso da reciprocidade. O pai de uma amiga minha, quando os filhos apareciam em casa a justificar o envolvimento em zaragatas 'porque ele também fez', perguntava-lhes calmamente: "Se um burro te der um coice, vais dar um coice ao burro?"
É isso a reciprocidade.
há certas coisas que me chocam nas mulheres
Não se preocupe, o meu pai tb pensava assim. E antes dele o meu avô, bisavô, suponho.
O meu pai achava que eu, a par de não dizer palavrões, não fumar e de me portar bem, tb devia saber cozinhar e passar a ferro. Ele e os meus irmãos não, estavam isentos por bula divina. Mas tenho que ser justa, nunca me chateou nem pressionou. Aprendi o que quis e quando quis.
Não digo palavrões por educação e hábitos, na minha casa ninguém dizia, nem mulheres nem homens. Nesse campo tenho que reconhecer que o meu pai era muito justo e moderno, só exigia o que dava.
Percebeu o contrário, sou mesmo míope. Não muito, mas ainda assim exige-me um esforço um pouco maior para distinguir as pandilhas ao longe. Olhe, neste momento a nova imagem do nosso prezado continua um tanto 'blurred'.
Quanto ao Hafid Bouazza, realmente não o conhecia de lado nenhum, se não é de extema-direita faz-lhes um jeitão. Não pelo que diz, com toda a certeza que conhece o 'milieu' muito melhor do que eu e sabe do que fala, mas por alinhar em tiros no pé estúpidos. Os tiros são sempre estúpidos, nos pés ainda mais. E além disso mantém um tipo de site que, se fosse meu, o sr. Carmo acharia impróprio.
Adoro as duplicidades dos países civilizados, dos outros já não espero nada.
Pronto, o site não é dele. Mas tem pinta disso.
Então não lhe adiantou de nada a trabalheira da tradução… Que pena!, mas não desista. Traduza-lhe este, é daqueles que uma mulher desempoeirada aprecia. É uma outra história, menos cor-de-rosa, a daquelas que pensam que podem dizer palavrões e ter sites impróprios até que alguém lhes lembra que há direitos de exclusividade seculares.
E poupe-me à cantilena de que na Holanda bla bla e mais bla bla…
Apresse-se, o outro marroquino ainda lhe passa a perna e depois vem para aqui carpir contra os árabes.
vivi a ilusão da liberdade, daquela liberdade sonhada
em que se pode ser casada e solteira
infantil e madura, morena e oxigenada
aquela liberdade atemporal em que se pode fazer tudo
sem ser condenada
em que as leis são individuais, as faltas puras
vivi a ilusão de que poderia sobrevoar os edifícios e
sorrir feito criança, que poderia satisfazer meu corpo
sem pagar preço alto e até mesmo nenhum
a liberdade que cheguei a experimentar me tirou de órbita
me fez perder peso, ganhar viço, acreditar
por uns instantes tive o gozo flutuante, fui inocente e fui eu
eu por uns dias, eu fui eu por uns céus
fui ser quem eu era ao nascer, antes de ser educada,
resumida, adestrada, induzida, aplicada,
antes de ser abatida em pleno voo
Martha Medeiros
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