Há realmente algo de espantoso: é esta admiração dos mais endinheirados e mais protegidos, que vivem em condomínios de luxo, pelos jovens dos subúrbios que deitam fogo a carros, escolas, ginásios, creches ou autocarros. Que Mathieu Kassovitz e Claude Chabrol [respectivamente actor e realizado francês. CdR] aplaudam e peçam mais indigna-me, e acho que não ajuda de maneira nenhuma estes jovens, sinto-me mais útil e mais solidário com o problema do que com a cultura Canal + .
Critiquemos a sociedade pelo aquilo que ela tem de pior, e o pior é nomeadamente este jet-set, este “showbizz” que aclama a sublevação dos subúrbios. Porque na realidade o que é que eles representam? O dinheiro fácil, o prazer imediato, o acesso a tudo.
Vivemos no mundo da instantaneidade, e no mundo da instantaneidade a mediação da escola não faz sentido, e esta gente são os representantes do mundo da instantaneidade que nós criamos como modelos para os jovens. É evidente que alguns até são bons rapazes, outros menos: temos Jamel Debbouze [cómico e actor francês de origem magrebina. CdR] e temos Joey Starr [rapper polémico. CdR]. Mas há também o rapper 50 cent, e 50 cent é o artista que vende mais discos no mundo. E chama-se 50 cent. O que significa que ele se chama dinheiro. Ele fez um filme autobiográfico intitulado Get Rich Or Die Trying (enriquecer ou morrer).
É evidente que se propagamos este modelo estamos, pelo menos, a criar impaciências na juventude das nossas escolas... Você sabia que Karen Montet-Toutain, a professora que foi apunhalada [num liceu de Essonne, perto de Paris. CdR] era vista com desdém pelos seus alunos? E não falo daquele que a atacou, esse era um chalado e não se pode generalizar o seu caso. Tão pouco se pode responsabilizar a totalidade de uma turma pelo gesto abominável de um indivíduo, mas falo da turma, a própria turma fazia pouco dela. E você sabe porque razão faziam pouco dela? Porque ela ganhava apenas 1500 euros por mês. Podemos considerar que os problemas sociais desta gente vem também da sociedade de consumo e dos valores que ela veicula através das vedetas do basquetebol e do showbizz. Mas também através dos traficantes de droga - o mundo do dinheiro fácil.
Porque se você vai à escola, sabendo de antemão que € 1500 é medíocre, você não vai lá para aprender. Houve uma época, não assim tão remota como isso, talvez você ainda a tivesse conhecido, em que os professores eram respeitados pelo seus conhecimentos, e para nós faziam parte da elite, sem ter em conta o montante da sua conta bancária. Hoje em dia isso já não é possível, a conta bancária tornou-se o bilhete de identidade de cada um. Estamos hoje perante um terrível problema social, vamos ter que o encarar e que o resolver.
Durante os distúrbios víamos uma maioria de jovens africanos e magrebinos, mas ver e dizê-lo era já o suficiente para uma pessoa ser considerada culpada, ou racista. E os mesmos que nos culpavam diziam-nos que o problema é social. Ai sim? Mas então, se o problema é social, puramente social, porque razão nos dizem que para resolver o problema é preciso mudar a nossa visão da história, da escravatura e da colonização – um movimento social não exige isso!. Porque razão é preciso assegurar uma melhor representação de minorias visível no espaço público, no parlamento e na televisão – um movimento social não exige isso. Ou então trata-se de um movimento social a que se pensa responder por medidas de discriminação positiva.
Estão a gozar comigo! Estão a gozar comigo! Estão a gozar comigo!
Um certo número de pessoas elogiou estes distúrbios relacionando-os às insurreições raciais americanas, nomeadamente Yann Moulier Boutang, que disse serem revoltas raciais! Outros, como …….. Tod, afirmaram que eram revoltas raciais para obter igualdade. E como eles diziam que se tratava de busca pela igualdade ninguém viu nada de mal. Eu disse que eram revoltas raciais mas não as justifiquei.
Mas se você disser que são revoltas raciais sem as justificar, no discurso de esquerda isso é ser um racista. A mim preocupa-me este ódio de que a França é alvo, este ódio que se ouve num certo número de textos de rap – quando se faz rimar ‘panam’ com ‘napalm’. Quando se diz que temos que foder a França como se fode uma puta. São coisas que ouvimos. [o entrevistador diz: “mas isso é um rapper mesmo muito pouco conhecido”]. Escute lá, você sabe muito bem que na Internet ainda há coisas bem piores! E que de uma maneira geral há uma interligação entre o rap e a violência – porque há violência no ritmo. O que é que faz a música? É a melodia. No rap não há melodia, é um vociferar monótono.
Bom, eu acho que tenho o direito de fazer uma crítica de ordem estética e política ao rap. Ainda por cima temos o Eminem e um certo número de rappers brancos, por isso não me venham dizer que criticar o rap tem a ver com racismo. Toda esta violência tem que ser vista tal qual é, e tudo aquilo que tenho a dizer é que os brancos, os franceses de origem, os europeus, não têm o monopólio do racismo. O rap - assim como a cultura hip-hop - como é originário da cultura dos subúrbios é à priori vista com reverência – só pode ser bom! Não.
Quando vemos jovens (magrebinos) baterem noutros jovens só porque estes têm caras mais pálidas e roubar-lhes o portátil – o que é isto senão uma “ratonnade” [designação francesa para uma rusga contra árabes, mas neste caso racismo ao contrário – CdR].
O problema é mais grave, porque, como diz Michel Tibana, vemos em certos bairros um fenómeno de substituição demográfica, porque as pessoas de origem francesa ou europeia abalam. Partem, e eu não estou seguro que o façam pelo facto de serem racistas. Porque, desde quando é que a miséria ou a revolta passa pelo incendiar do carro do vizinho, de autocarros e…… de ESCOLAS?
O humanista deve estar do lado das escolas, não dos que as incendeiam….
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No mês de Dezembro tive que fazer uma reportagem fotográfica de uma série de workshops em escolas numa cidade a norte de Amesterdão. O tema era sempre A Palavra, mas vista de vários ângulos. Num dos workshops as crianças aprendiam a rimar em rap, noutro aprendiam a desenhar contando uma história a partir de um tema dado e noutro tinham que tirar fotografias (à volta da escola) relacionadas com um poema que o professor escolheu, etc.
Numa destas classes pede-se às crianças para escreveram num papel as suas previsões, ou aquilo que desejariam ter no futuro. Muitas destas crianças, tanto rapazes como raparigas, e na sua maioria estrangeiros (turcos e marroquinos) tinham expectativas completamente aberrantes, pelo menos a meu ver e também do professor presente, mas que ajuda a compreender melhor a entrevista de Alain Finkielkraut.
Achei a lista de desejos destes alunos tão estranha que a fotografei:
Numa das fotografias lê-se: minha mansão; 6 guarda-costas (!); relógio da moda; gajas boas (no plural!); matrícula de carro; telefone (certamente portátil e o último modelo).
Na outra: Minha mansão; uma quantia em € astronómica; 3 guarda-costas; 5 cofres-fortes; muitos relógios; 15 x (não consigo decifrar); uma barbearia; sempre ‘döner’ (carne grelhada à turca).
3 comentários:
O que constrange é ver os meninos bem a "compreenderem" um fenómeno que lhes pode chegar o fogo ao rabo.
Acho que esta gente pensa que está a assistir a um espectáculo, das bancadas e não entende que faz parte do espectáculo e que está tb a arena.
Mas, de certo modo, é esse o problema da esquerda floribélica...gente que pensa que redime a culpa, pondo-se do lado dos inimigos do grupo a que pertence.
Os resultados são sempre maus, mas a memória histórica é curta..
CdR
Chamar música ao "rap" é uma ofensa à música...
@ holandês voador: « Chamar música ao "rap" é uma ofensa à música...»
Bom, parafraseando o Finkielkraut, “eu acho que tu também tens o direito de fazer uma crítica de ordem estética ao rap….”
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