[...]
Sob a governação democrática a conduta moral foi substituída por uma corrupção sociológica, promovida por "peritos" na recomendação de "comportamentos" e na avaliação de "resultados". O projecto "democrático" assenta na negação da oposição maquiavélica entre considerações de interesse de Estado e considerações morais: não só não são incompatíveis, mas são, afirmam os defensores do projecto, complementares. A salvação do planeta, a extinção dos males da fome e da doença, a paz perpétua ou a maior felicidade do maior número são diferentes racionalizações éticas deste imperativo político. O potencial atractivo da causa atrai a simpatia geral e desperta em muitos um ardor beato que nenhuma quantidade finita de recursos centralizados sob o comando do poder político é capaz de satisfazer. A atribuição de um sentido moral ao projecto condena a dissensão política e fomenta o culto do poder. Em consequência, a participação na associação política perdeu as características da cidadania e deu lugar ao "utente" passivo, o utilitário vulgar, o "porco satisfeito" que John Mill temia mas a quem serviu de parteira ideológica. Destruída a ficção representativa e evaporada a responsabilidade política com a proliferação de aparatos de poder, infra e supra Estados, que fazem política sem qualquer vislumbre de legitimidade, a máxima de Lincoln precisa de actualização: a democracia é hoje o governo de eunucos, pelos eunucos e para os eunucos.
It is quite gratifying to feel guilty if you haven't done anything wrong: how noble! (Hannah Arendt).
Teste
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quinta-feira, 12 de agosto de 2010
Do ardor beato
No Diário Económico, Fernando Gabriel em O Governo dos Enuncos:
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