Já por várias vezes tenho defendido a tese de que a mal disfarçada simpatia da esquerda ocidental com o islamismo e os fenómenos ditatoriais do nosso tempo, desde Castro a Chavez, a par do cada vez mais gritante anti-semitismo, disfarçado de “anti-sionismo”, busca raízes no próprio âmago das ideologias que brotaram do marxismo, nomeadamente no ódio visceral ao capitalismo e à cultura e civilização que lhe estão associadas
A nível filosófico não é difícil demonstrar esta tácita aliança.
Mas também é verdade que a generalidade das pessoas de esquerda conhece tão bem as “teologias” socialistas e comunistas, como a generalidade dos católicos conhece os meandros da doutrina em que acredita.
Ou seja, mal.
É aliás por isso que tanta gente vota no Bloco de Esquerda. Pura e simplesmente não sabem o que é o trotskismo, nunca ouviram falar da 4ª Internacional e votam por simpatia, porque o “Louçã fala bem” e “diz as verdades”.
Assim sendo, não é por fanatismo ideológico que as pessoas de esquerda, de um modo geral, tomam partido pelos islamistas, pelos palestinianos, pelos imigrantes, por Chavez, etc, contra os “poderosos”, os judeus, os americanos, etc.
A razão fundamental é aquilo que Lenine identificou como a psicologia do “idiota útil”, aquela pessoa que é basicamente um “emo”, que está sempre do lado daqueles que percebe como mais fracos, seja qual for a solidez ética e moral da sua posição.
Para esta gente, os que se apresentam como fracos têm sempre razão. A fraqueza é sinónimo de virtude.
Falta-lhes portanto uma bússola moral.
Não são cínicos…é gente geralmente bem intencionada, que quer fazer o bem, cujo coração sangra genuinamente. O problema é que, numa dada situação, não são capazes de identificar correctamente onde está o bem e o mal.
Daí o recurso imediato à grelha marxista das dicotomias maniqueístas: o fraco é o bom, o palestiniano é o bom, o pobre é o bom, o africano é o bom, o proletário é o bom. Os maus são automaticamente os ricos, os fortes, os brancos, os burgueses, os ocidentais, os capitalistas, os judeus, etc.
É esta confusão moral que os leva a estar do lado dos ditadores, desde que estes sejam contra o Ocidente. Se são contra o Ocidente, então são “bons” e nas suas cabeças não entra facilmente a consequente dicotomia entre os tais “bons” e o seu próprio povo oprimido. Por isso ignoram-na.
O conflito israelo-árabe, ilustra bem esta tese. No início Israel era a parte fraca, atacada por milhões de árabes façanhudos. O povo de esquerda estava com Israel, porque quem tinha os carros de combate eram os árabes e, por isso, não podiam ser os “bons” nem ter razão.
Hoje são os israelitas que têm F-16, ao passo que os árabes da Palestina têm “só” Kassans e Katiushas. Isso basta para demonstrar que os “culpados” são os israelitas e que nenhuma razão lhes assiste.
Não é que esta gente de esquerda seja ideologicamente anti-semita. Eles próprios o negam e fazem-no com sinceridade. São simplesmente naives e falhos de capacidade de julgamento moral. Também não são ideologicamente totalitários, e negam sinceramente que tenham alguma agenda similar a Fidel Castro, a Chavez, etc.
Acabam por ser objectivamente anti-semitas e apoiantes do totalitarismo, apenas porque são “idiotas”, no sentido que Lenine dava ao termo.
12 comentários:
Este artigo coincide em muitos aspectos com aquilo que eu próprio tenho pensado,mas não seria capaz de explicar tão bem. Por outro lado vem elucidar o mecanismo do pensamento da esquerda ao apoiar regimes e posições que estão nos antípodas dos princípios básicos da esquerda clássica, esclarecendo dúvidas que por vezes me deixavam espantado.
Lidador, eu copio aqui o comentário feito no site "Triunfo dos Porcos", também administrado por vós. Eu acrescento que é elogiável sua capacidade de iluminar detalhes numa paisagem, mas eu digo-vos que já é possível nomear a obra.
Esse sistema apontado por vós, no qual delibera-se sempre pelos fracos de ocasião, foi criado por pessoas de carne e osso. Não é assim uma chuva caída de alguma nuvem sobre pobres mortais pecadores.
Ofereço-vos três endereços de notícias recentes para ilustrar meu argumento:
1. Ouça a voz de David Romero, diretor da rádio Globo fechada pelo governo de Honduras em http://vimeo.com/6825710
2. Leia sobre o apoio de Bispo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil ao candidato do Partido dos Trabalhadores à vaga de ministro na corte máxima brasileira.
3. Leia sobre a punição imposta pelo Partido dos Trabalhadores - do presidente da república - a dois partidários, porque eles participaram de uma passeata contra o aborto, por exemplo, em http://www.radiocidade.com.br/index_noticias.php?id=VFZSUmVVNTZUVDA9
Quero dizer-vos da superficialidade em comparar-se católicos ignorantes e simpatizantes de esquerda, pois o sistema funciona porque a doutrina stalinista está manifestada por lideranças até dentro da Igreja ao longo dos, digamos, últimos 60 anos. Tratou-se de uma grande construção ao longo desse tempo, e, hoje, podemos vê-la majestosa.
Enfim, novo altar de adoração onde muitos estão abandonando princípios de civilidade por bens momentâneos.
Permito-me dizer isso a vós em vosso espaço oferecido, pois sei que não compactueis com o ataque pessoal para contra-argumentar, do tipo: "ela é católica, reacionária, branca, de direita, e etc."
Nausicaa, onde estão católicos poderiam estar muçulmanos, hindus, evangélicos, what else. Referi católicos porque são aqueles que predominam na sociedade onde vivo. A comparação, neste post, foi só no sentido que a generalidade dos católicos, tal como a generalidade dos esquerdistas, tal como a generalidade dos protestantes, etc, não conhece bem a teologia que sustenta a ideia em que acreditam.
Se, por exemplo, perguntar a 100 católicos quantos e quais são os Evangelhos que constituem a base doutrinária dessa religião, posso apostar que mais de 90% não lhe sabem dar uma resposta. E esse nº, ou talvez maior, nunca sequer leram um desses Evangelhos.
Provavelmente a mesma proporção de "comunistas" que leram o Capital ou o Manifesto Comunista.
Para além disso, mas por aí não vou agora, a nível filosófico esta mentalidade de "idiota útil", não se pode desligar da chamada "Teologia da Libertação" e da convergência de vários clérigos cristãos com os movimentos ligados ao marxismo...
Wish You Were Here (Waters, Gilmour) 5:17
So, so you think you can tell
Heaven from Hell,
Blue skys from pain.
Can you tell a green field
From a cold steel rail?
A smile from a veil?
Do you think you can tell?
And did they get you to trade
Your heros for ghosts?
Hot ashes for trees?
Hot air for a cool breeze?
Cold comfort for change?
And did you exchange
A walk on part in the war
For a lead role in a cage?
How I wish, how I wish you were here.
We're just two lost souls
Swimming in a fish bowl,
Year after year,
Running over the same old ground.
What have we found?
The same old fears.
Wish you were here.
Lidador:
Excelente post! Expõe elementos implícitos naquele "desabafo" que deixei aqui há umas semanas e que originou a resposta da ml, depois publicado pelo Carmo da Rosa. E não só os expõe como os clarifica sucinta e concisamente.
Infelizmente, continuo sem tempo não só para responder à ml como também para dar continuidade a alguns aspectos deste seu texto, os quais gostaria de desenvolver. Talvez já o consiga daqui a uns quinze dias.
CdR:
Não sei se valeria a pena mudar de mãe, só para obter um jantar com pequeno-almoço incluído em companhia da referida senhora. Há conversas que indispõem logo o estômago, seja para que repasto for. A mim, pelo menos.
Quanto ao que diz do conhecimento do cidadão comum do Norte da Europa sobre os textos religiosos cristãos, não se esqueça de que esses textos cumpriram uma função dupla nesses países: o de suporte de contestação religiosa a Roma e, por consequência, o de autonomia política dos países periféricos em relação a Roma, quer dizer, em relação ao centro do poder europeu da época. Essa situação levou ao estudo ou, pelo menos, ao conhecimento generalizado dos textos bíblicos, mais ou menos como "catecismo revolucionário" ou de resistência, originando uma cultura em que determinados princípios se tornaram em elementos de definição de pertença à comunidade e de esteio identificativo e de preservação histórica dessa mesma comunidade.
No Sul da Europa, o cristianismo nunca teve essa função, foi um motor de transformação do Império Romano e das nações bárbaras que depois o retalharam e não pretexto justificativo de autonomia ou independência. Não foi, por isso, necessário "memorizá-lo" como princípio de vida colectiva futura, foi-se substituindo ao que havia anteriormente e transformou-se assim em modo de estar na vida, apenas. O que também já sucede, afinal, na Europa do Norte, mas ainda em menor grau e com outras reminiscências, como aquelas que deram origem ao seu comentário.
Penso eu.
Até já.
Excelente artigo. Mais certeiro era impossível.
Caro Cdr, tenho as minhas dúvidas sobre a sapiência religioso-teológica da maioria dos crentes de qq religião/ideologia. Alguns sabem, são a "vanguarda" de que falava Lenine, os poucos iluminados que conhecem a fundo os meandros da doutrina.
Os restantes seguem o ritual.
Não que o ritual não seja importante...na verdade é até o mais importante para a maioria das pessoas.
De qq modo, penso que mesmo que fosse verdade que 90% dos calvinistas são verdadeiros teólogos, isso não acontece com a maioria dos esquerdistas, que de Marx, Lenine, Trotsky, etc, conhecem apenas o folclore heróico.
São "shallow"....
Relativamente a Israel, por exemplo, se de repente se visse na mó de baixo, a ser lançado ao mar, os esquerdistas seriam os primeiros a lamentar e a apoiar os infelizes.
Faz lembrar Carter, que andou estes anos todos a alabar Chavez e há dias veio dizer que afinal, se calhar, enganou-se e tal.
De resto o mesmo zote já havia dito coisas semelhantes de Pol-Pot, um gajo porreiro e tal, e que chatice, enganámo-nos e lá foram 3 milhões de pessoas à vida.
Caro CdR
"Nasci em Marrocos." Parece que já somos dois, mas a tal senhora, se não compreende a alcunha, fica equivocada! Mas confesso que deu vontade de rir.
Caro Lidador, a análise que fez da esquerda está correcta. Dos meus tempos de comunista, não me recordo de nenhum camarada que se desse ao trabalho de ler "O Capital".
Eu incluido. Embora tivesse lido História e alguns textos sobre o Marx, os meus conhecimentos teóricos eram fraquissimos.
"ej, não há equívoco da senhora, eu nasci mesmo em Marrocos."
Ah, boa! NAscestes numa sociedade não materiallista!...
Claro, Carmo da Rosa. Estava a brincar com a situação!
:-)
As pessoas são pessoas. Se viverem numa sociedade que as deixe viver em paz, toda a gente procura basicamente o mesmo (emprego, dinheiro, prosperidade, etc). A senhora em questão anda (ou andava) muito equivocada sobre a natureza humana.
Ejsantos:
"A senhora em questão anda (ou andava) muito equivocada sobre a natureza humana. "
Não andaria, provavelmente.
Acha talvez que a natureza humana será o que ela diz ser. Nos intervalos vai elegendo, de acordo com as conveniências, uns tantos de serão como ela diz que é.
Enfim, conversas de sacristão.
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