Outra causa que a esquerda normalmente deixa a mão, não lhe merece destaque como diz Paulo Porto, é a situação actual na Coreia do Norte. Gostaria apenas de atenuar ligeiramente esta afirmação: já existe uma esquerda que tem a coragem de falar nestas coisas, por exemplo a jornalista Holandesa Bettine Vriesekoop, mas também, e isto é muito mais importante, um escritor chinês que não faz parte dos habituais dissidentes do regime.
O relato que o escritor Chinês Ye Yonglie fez da sua viagem turística à Coreia do Norte foi, pouco antes do início dos Jogos Olímpicos, rapidamente retirado das prateleiras pelas autoridades chinesas. Quem nos diz isto é Bettine Vriesekoop, jornalista e ex-campeã da Europa de ping-pong (1982 e 1992), e também vencedora do Top-12 da Europa em ’82 e ’85. Depois de muitos estágios na China e contactos com jogadoras Chinesas resolveu aprender a língua e estudar Sinologia e Filosofia Oriental. Actualmente é uma das enviadas especiais na China para a imprensa holandesa. Nota-se no relato dela e de outros jornalistas que os Chineses já começaram a sair da casca…
“A Coreia do Norte é um fóssil comunista vivo. Toda a gente tem um broche na lapela com a cabeça do ‘Grande Líder’. Por todo o lado se vêem bandeirolas com textos dizendo ‘Kim Il Sung é imortal’. Mas só cidadãos exemplares é que podem viver em Pyongyang, na capital. Deficientes ou pessoas com familiares radicados na Coreia do Sul são desterrados. As mulheres não podem andar de bicicleta nem andar sozinhas na rua. À noite a cidade é escura como breu e a electricidade vai-se abaixo pelo menos 200 vezes por dia”
Uma passagem do livro A Verdadeira Coreia do Norte de Ye Yonglie.
Ye Yonglie vive num modesto apartamento do centro de Pequim onde nada transparece a figura de um escritor bastante famoso. Centenas de milhões de crianças leram o seu livro Dez Mil Perguntas, e nos anos oitenta ficou famoso com a sua biografia de Jiang Qing, a mulher de Mao Tse Tung. Mas o reconhecimento internacional veio com o seu último livro sobre a Coreia do Norte.
Ye queria passar um mês na Coreia do Norte, mas como escritor não conseguiu visto, resolveu então introduzir-se no país juntando-se a um grupo de turistas chineses. Durante toda a sua permanência foi perseguido por agentes Coreanos e as suas fotografias digitais foram-lhe retiradas da máquina na fronteira, no fim da viagem. Mas como o funcionário da aduana não sabia o que era uma pen ele conseguiu salvar muitas fotografias, de que mais tarde se serviu para mostrar em que estado é que o país realmente se encontra.
Segundo Ye, a Coreia do Norte é comparável à China de Mao durante o período da Revolução Cultural (1966-1969), onde as pessoas morriam de fome. O país, que festeja este ano os seus sessenta anos, está completamente arruinado, a população passa fome e está sob uma lavagem ao cérebro constante.
Baseado no seu relato de viagem e nas suas fotografias, Ye escreveu um longo ensaio que foi publicado em forma de livro mas também colocado na Internet, e foi mesmo feita uma rádio-novela transmitida pela Rádio Pequim. E como os Chineses não têm a mínima ideia do que se passa na Coreia do Norte, a série na rádio era muito popular. Foi nesse momento que a Embaixada Norte Coreana protestou junto do governo chinês da forma como Ye retratou o país, e as autoridades chinesas retiraram o livro das prateleiras.
Com a abertura dos Jogos Olímpicos à perna a China não queria que o pensamento ‘One World One Dream’ fosse perturbado – nem mesmo pela vizinha Coreia do Norte. Mas a proibição do livro foi contraproducente, o livro tornou-se mais conhecido do que já era. A proibição de livros na China já não é tão fácil como era dantes.
”Eu visitei a Coreia do Norte com a intenção de observar a Coreia com os olhos de um turista Chinês. Queria apenas descrever a realidade. E a realidade é que um ditador megalómano sequestrou um povo inteiro de 24 milhões de almas. Nunca vi tanta fome. Na fronteira, mal tínhamos saído do comboio, que os funcionários dos caminhos de ferro se atiraram como lobos esfaimados para cima dos cestos do lixo para arrebatar os últimos restos de comida dos sacos de merenda que nós deitamos fora.
Por todo o lado via-se bandeirolas a dizer que ‘Kim Il Sung é imortal’; ‘A educação é gratuita’; ‘não há drogas’; ‘não há prostituição nem corrupção’. A utopia comunista é por todo o lado vangloriada, mas na realidade as pessoas vivem com a morte sempre presente. Os hotéis estão vazios, não há comércio e as pessoas vestem-se todas de roupa cinzento escuro. A população foi completamente silenciada.”
Ye compara o seu livro com os Versículos Satânicos do escritor britânico Salman Rushdie. ”Quando o livro de Rushdie deu origem a uma ‘fatwa’ no Irão, a rainha Elisabeth protegeu Salman Rushdie e o livro foi publicado. E o que é que acontece neste país? A China não tem uma rainha e ajoelha-se perante o irmão mais novo. Eu esperava uma atitude mais firme de Pequim.”
Ye não compreende a atitude submissa das autoridades Chinesas em relação à Coreia do Norte. Lembra que a Coreia, por sua vez, em momentos cruciais nunca se mostrou um país amigo da China. ”Quando a China se candidatou aos Jogos Olímpicos de 2004 a Coreia votou contra. Todos os Chineses ficaram chocados. Onde estava a solidariedade norte-coreana?”
Ye tem esperanças que a Coreia ainda vai abrir as suas portas ao mundo, assim como a China. ”A morte de Kim Il Sung é talvez a última hipótese para salvar o povo coreano de morrer de fome.”
10 comentários:
Essa jornalista e esse escritor são lacaios do ocidente. Publicam mentiras sobre o regime norte-coreano, esse farol da humanidade.
The Soviet Story - A História Soviética (PT-BR)
http://br.youtube.com/profile?user=movimentoendireitar&view=videos
"Essa jornalista e esse escritor são lacaios do ocidente"
Ele é certamente um lacaio do ocidente, ela, além de lacaia é dor de corno, porque na realidade o que ela queria, era ir viver para a Coreia do Norte, mas não foi aceite. Isto de viver na Coreia não é para todos. Um cartãozinho de membro do comité central do PCP talvez ajudasse...
É verdade. De facto nestes últimos 4 anos morreram dois milhões de pessoas pela fome e há canibalismo em muitas regiões. 6 milhões estão a viver com 175 gramas de comida por dia. Vai valendo a ajuda humanitária da Coreia do Sul em centenas de milhares de toneladas de alimentos. Recentemente a ONU deu 60 milhões de dólares em ajudas alimentares. Dois meses de pois a Coreia do Norte comprou 90 milhões em material militar. Ajudar estes países é roubar aos pobres dos que dão ajuda para dar os ricos nos que precisam.
Na verdade é bom que exista a Coreia do Norte, o Zimbabwe e outros.
São vacinas que asseguram que o socialismo não se consegue desligar completamente dos monstros que tende a produzir, refugiando-se nas regiões siderais das boas intenções e da fé na utopia que há-de vir.
Caro CdR
É verdade que, visto da direira, ocorre a generalização 'se é estúpido é de esquerda'. Admito, claro, o exagero, e lembro-me que o RB uma vez por aqui separaou as coisas nomeando-as 'esquerda estúpida' e 'esquerda briosa'. Mas há um problema que se mantém: é que a esquerda briosa, além de escassa, é mais repudiada pela esquerda estúpida do que pela direita.
”mais repudiada pela esquerda estúpida do que pela direita.”
Caro PP,
Talvez. Mas eu tenho uma grande dificuldade com estas generalizações simplistas porque na sociedade em que vivo, ao abordar os grandes temas actuais (multiculturalismo, Islão, economia, América, Iraque), é absolutamente impossível fazer estas divisões simples entre esquerda e direita, quanto mais acrescentar adjectivos pejorativos à coisa.
Isto é uma visão da realidade dos anos setenta, onde as coisas eram bem mais simples, era-se de esquerda (contra Reagan, contra os mísseis e pela paz a qualquer preço com a URSS, e a culpa da miséria no terceiro-mundo era sempre do Ocidente) ou então irremediavelmente de direita, ver mesmo reaccionário.
Mas se a coisa funciona assim em Portugal, quer isto dizer que Portugal ainda se encontra (politicamente falando) nos anos 70! Mas custa-me a acreditar! Basta-me dar uma olhadela pelo Arrastão (um blogue de esquerda) e notar que a maioria das reacções aos artigos do Daniel Oliveira não ficariam mal no Fiel…
Lidador,
Chamar socialista ao regime de Mugabe, só por humor (negro, neste caso).
Trata-se de um regime cleptocrático, controlado por alguém completamente insane que, mais do que um sistema, já só defende a si próprio.
Quanto muito um regime tribal e racista que usa uma pretensa ideologia pós-colonial para justificar todos os seus crimes. Se isto é socialismo, eu vou ali e já venho...
Lá está, holandês. O homem diz-se socialista, chefia um Partido cuja ideologia é socialista, nacionalizou a terra, estendeu o controle do estado a todos os aspectos da vida económica, tabelou preços, etc.
Mas como a coisa deu no que deu, deixou de ser socialismo.
POrquê?
Porque o holandês acredita que o socialismo é uma ideia que ele tem na cabeça e que é boa.
Agora repare. Todos os países que aplicaram a receita socialista deram nisto ou parecido.
O que fazer?
Os factos não estão de acordo com a teoria?
Muiot bem...decreta-se que nenhum facto desagradável é "verdadeiro socialismo", classificação que deixa pois de estar agarrada à realidade e passa a residir algures na estratosfera das boas intenções.
E pronto, não sendo o socialismo deste mundo, nada do que aconteça neste mundo o pode colocar em causa.
Torna-se irrefutável pelos factos.
E o que é irrefutável pelos factos?
Exactamente: a Fé!
”Chamar socialista ao regime de Mugabe, só por humor (negro, neste caso).”
Na minha opinião o Lidador tem razão, há ou não há no regime Mugabe, pelo menos à partida, todos os ingredientes socializantes?
Aliás ele sempre se reclamou marxista! Que a coisa não seja precisamente como a Coreia, a China, ou o Vietname é compreensível – tem todos os vícios e as qualidades da cultura Africana. No caso dele diria mesmo que só tem os vícios…
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