UM PACTO PARA PAGAR O PATO
Subi as escadas um pouco apreensivo. Ainda me parecia um sonho...Eu no meio dos duros, no convívio com aquela rapaziada que sempre admirara! Os manos que sabem como é, wise guys sem tirar nem pôr.
Rapazes espertos, gente que não se desalinha. Os que manejam de facto a sociedade e os seus meandros, que respondem às dificuldades da crise e que dão o mote para a vida com letra grande.
Lá passei o guarda-costas, o porteiro matulão e calado que logo cerrou o matacão daquela porta pesada como um portão de herdade. Levantei os ombros, não ia deixar ficar mal a minha gente. Assim como assim, eu, um descendente do Vimioso…do Marceneiro…
O Al, com o seu charutão ao canto da beiçola quase nem me deixou ambientar.
- E então cá estamos nós, rapazes! - disse com o seu jeito de boss - E não vamos perder mais tempo: é preciso que tudo corra nos conformes, muito há em jogo nesta nossa reuniãozinha! Pois o caso é que concluí haver necessidade de elevar o nível do nosso meio. E que melhor para isso que efectuarmos um pacto? Parece que tem muita saída e dá resultado, já com os calabreses foi assim. Além disso andam por aí umas massas a agitar-se: o professor Tournesol ameaça de novo convocar greves e manifestações, o Dick Tracy com os moços de giro vai sair à rua, o próprio capitão Haddock já pensou em nos atirar para cima mil milhões de macacos fardados. E temos de apaziguar o Xerife de Boliqueime, que já anda novamente enfiado...O caso dum tal Louceiro...
- Cá por mim - adiantou logo o Floyd Três Dedos - nem era preciso tanto trabalho... Combinava-se de antemão o assunto com o Jaime e outros comparsas e se alguém se pusesse com tretas...a minha rapaziada dava-lhe o arroz! Compreendeu, Capone?
- Aguenta! - vociferou o Babyface Nelson, com a mão no lado esquerdo do casaco assertoado - Também tenho alguma coisa a dizer, Floyd... As coisas já não são o que eram, temos de ter cuidado. Não penses lá agora que com esta onda de simpatia pela elevação a presidente do Lucky Luciano já podemos andar a fazer tudo. As massas são imprevisíveis, não viste como foi com o Madoff e Costa? Eu por mim opino que nos devemos ficar apenas por acordos pós-assalto ás assembleias...!
- E eu punha como modelo, limpinho e sem osso e para não falharmos, como cabeça de cartaz um Don das quadrilhas autárquicas com palheta e acabava-se a confusão. Ou se fizesse falta a valer, um do meio desportivo, que têm experiência em sociedades secretas e biografias...É coisa de futuro - relinchou o Floyd com rudeza.
O Al, ponderadamente, abanou a cabeçorra poderosa e riu um pouco.
-Eu hoje estou muito paciente, Floyd. Não fôsse isso e já tinhas a caixa dos pirolitos amolgada. Capici? Vamos mas é deixar-nos de tretas e inspirar-nos, quando muito, no colega Sarkony dos gangs de Marselha, ou mesmo experienciar com a escumalha de Bruxelas... E está dito: o pacto tem de vir a lume ainda nesta rentrée e mai’nada!
A intervenção dele despoletou uma algaraviada do caneco. Um dizia, outro replicava... Eu estava a ficar algo chateado.
E foi então que, lisboeta de lei que sou, me empolguei e rapando da automática escaquei um tirázio para o ar.
Calaram-se todos, pois então.
E no breve silêncio pesado que se seguiu eu disse, na minha voz bem timbrada de parlamentar do Bairro Alto, de descendente de oradores fadistas dos tempos da Severa de Nafarros, arrumando a questão:
- Ouçam, rapazes: não quero ser desmancha-prazeres mas arre! Eu acho que hoje por hoje só há um pacto como deve ser: artilhar-se aí um contrato com o nosso saudoso António, para que volte e nos salve da confusão desta puta democracia que já dura há tempo demais!
E, para reforçar o meu breve discurso, pronto para o que desse e viesse, coloquei sugestivamente a mão esquerda, apesar de não ser canhoto, na outra algibeira da minha gabardina.
À Bogart, claro.
It is quite gratifying to feel guilty if you haven't done anything wrong: how noble! (Hannah Arendt).
Teste
teste
quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009
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Alguém me explica porque têm a GNR e a justiça(?) que meter o nariz para saber se quem trabalha na pastelaria lá está dentro ou não?
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Um dos pilares do liberalismo e do mercado livre, é a constatação, colhida da prática, de que a concorrência, a livre formação dos preços, ...
1 comentário:
O Santos Silva, que não tem nada a ver com este artigo, há bocado na rádio pediu que os que espalharam a campanha negra sejam presos.
Assim mesmo, presos. Sem mais.
Só os parvos é que não percebem que se está a preparar umas acções concertadas de intimidação ou pior,
mas a ditadura não passará.
Xauter
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